208 segundo, 155 passageiros

Sendo o filme ufanista da temporada, Sully é uma dessas obras que você aprecia muito mais pela presença do Tom Hanks e, em alguns termos, pela abordagem humana escolhida; do que pelo seu todo, mesmo assim, vale ficar de olho!

Depois de uma revoada de pássaros o impedir de continuar a viagem, o voo 1549, pilotado por Chesley "Sully" Sullenberger e Jeffrey B. Skiles começou os procedimentos para retornar em segurança para algum dos aeroportos na área. No entanto, com os dois motores falhando e já com a ignição reserva acionada, Sully tomou a decisão de fazer o pouso acontecer nas águas do Rio Hudson. O ano era 2009, lá dentro estavam 155 passageiros e o piloto Sully só teve 208 segundos para fazer o pouso, de modo que este ficou conhecido como "O Milagre do Rio Hudson", quando todos os passageiros chegaram em segurança e foram resgatados com maestria. Não é um fato que estamos acostumados a presenciar, na verdade, em acidentes aéreos o mais comum é que não haja sobreviventes.
Sendo assim, Sully estampou as manchetes dos jornais como um grande herói. Participou de longas entrevistas, contou e recontou o que aconteceu e ainda foi congratulado (assim como o resto da tripulação) pelo Guild of Air Pilots and Air Navigators. Mas será que foi só isso que aconteceu?

Nessa narrativa fílmica, contada pelo intenso Clint Eastwood, vemos uma outra parte da história de Sully e cia, que talvez não tenhamos conhecimento. Especialmente nós, que não moramos nos Estados Unidos e/ou nos focamos em conhecer profundamente os seus heróis locais. No recorte escolhido, ficamos sabendo que depois do pouso, uma investigação foi construída para analisar o que aconteceu e as decisões dos pilotos, de modo a encontrar um culpado pelo incidente. Teriam sido as aves que bateram nas turbinas? Talvez fosse a engenharia do avião. Não teriam sido as coordenadas dadas pela torre de controle? Ou poderia ser que os dois pilotos fossem irresponsáveis em terem decidido fazer o pouso no rio...
Só que culpa não é algo que se encaixe com precisão nos acontecimentos ali, já que o menor dos detalhes seriam as questões burocráticas em face do simples fato de que todos sobreviveram. Certo? Errado! O filme mostra que o Diretório Nacional de Segurança do Transporte dos Estados Unidos (NTSB) simplesmente não conseguiu dar a história por concluída. Mas também, quem poderia culpá-los também? Eles estavam fazendo o seu trabalho.
Só que desse ângulo, o que parece nortear o filme é o questionamento d' "o que é suficiente?". Seria suficiente salvar a vida de todos? Salvar a aeronave também? Simulações computadorizadas, que não levam o fator humanidade em conta? Cálculos que mostrariam que eles poderiam ter pousado em outro lugar?

Sim, o filme se banha nessa questão, colocando Sully como um homem ético, do bem, com coração bom e que fez um sacrifício, confiando nos seus anos de experiência. Um herói mesmo. E com a atuação de Tom Hanks (que podia aparecer em um filme dançando a macarena, que ia ser um sucesso) vemos esse personagem crescer e ganhar camadas. Se aprofundando em seus medos humanos e suas próprias questões morais, inclusive não aceitando ser chamado de herói. 
Fora a presença ilustre de Hanks, o filme em si não guarda momentos de glória e/ou cenas inebriantes e basicamente se fia no elenco e na edição para dar intensidade ao filme. Sabiamente dirigido, a verdade é que Sully tem um roteiro fraco adaptado do livro "Highest Duty", mas graças a esse detalhe, conseguimos enxergar a força do cinema de Eastwood, que se supera na medida, mesmo que ainda mantenha a sua cara: meio sisudo, bem nacionalista, redondo, humano. Supera-se, especialmente, se levarmos em conta que a história gira em torno do pouso e do que aconteceu nos poucos dias que se seguiram, uma vez que o inquérito foi finalizado no início de fevereiro (sendo que o pouso ocorreu no dia 16 de janeiro). Graças a Eastwood e Hanks, Sully não foi resumido ao Rio Hudson...

Pitacos: Foi o filme que flopou nas indicações desse ano. Com apenas uma, em Edição de Som, acabou deixando a desejar e nem Clint e nem Tom Hanks foram lembrados. Pode ser que leve edição de som para casa, só par não sair de mãos abanando, mas acho difícil desbancar A Chegada.
Indicações: Edição de Som

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