Cinderela conseguiu resgatar a delicadeza dos contos de fada disneyanos, através de uma versão meiga, repleta de ensinamentos e dando ênfase naquilo que há de mais precioso na simbologia dessa personagem: sua bondade.
Há algum tempo temos visto uma tendência na produção de filmes em live action, baseadas em contos de fada, tentando vestí-los com uma roupa mais sombria e, talvez, mais contemporânea, querendo criar uma suposta imagem um tanto quanto "adequada" para ir de encontro com o desenho padrão disneyano. Aquele que, quando você pensa nas histórias relativas ao Era uma vez, vem logo na sua cabeça.
Como falei diversas vezes aqui no mesa, tal tendência pode ser explicada de diversos modos, assim como interpretada de diversas maneiras, como aquele que abordei em meu trabalho de conclusão de curso, falando que essas reinterpretações seriam um reflexo identitário e social, onde nós, não mais precisaríamos dos ensinamentos contidos nesses contos, uma vez que eles não seriam mais a nossa fonte de modus operandi social (saiba mais sobre o meu TCC aqui). Esse movimento é observado, não apenas no cinema, mas em livros, na TV, nas artes visuais e até mesmo na forma como a própria Disney tem se reconfigurado, a partir, por exemplo, da campanha "I'm a Princess", que entra em seu terceiro ano.
Porém, ao aderir à tais tendências ou demandas, de acordo com a forma a qual você interpreta, a Disney acabou errando a mão e produzindo o mal sucedido, "Malévola", que ao invés de dar um clima único é uma 'nova' interpretação a uma narrativa por muitos considerada ultrapassada (faz me rir com essa palavra) acabou por transformar uma vilã (divônica) em uma rala intepretacão de falsa bondade. Logo, não precisamos dizer que assim eles repensaram a posição e agora saíram com uma versão atualizada, porém que mantém as mesmas crenças daquela de 1950, mas claro, com ares pertencentes à toda filosofia da dita campanha, "I'm a Princess".
Nesta versão somos ambientados a uma reino tipicamente Inglês, bem ao estilo Austeniano, onde o clima bucólico, animais por todos os lados, um dia a dia pacato de leitura, conversa, costura e afazeres domésticos são a tônica. Cinderella (Lily James) chama-se Ella e enquanto cresce na companhia de seus pais e no âmbito de um lar perfeito, vai se tornando uma moça generosa, boa, corajosa e fiel aos seus valores. Como tal, nem mesmo quando perde a mãe (Hayley Atwell), seu pai (Ben Chaplin) se casa com Madame Tremaine (Cate Blanchett) e ele acaba morrendo, as suas características se perdem. Interessante, inclusive, perceber como nós, inconscientemente pensamos em formas de revidarmos o comportamento maldoso da Madrasta, enquanto Ella se foca em continuar sendo generosa. Pois é justamente por se manter crente em seus princípios que Ella é recompensada diversas vezes, seja pela amizade fiel de seus amigos animais, seja pela aparição de uma Fada Madrinha (Helena Bonham Carter), assim como são suas características que fazem com que o Príncipe Kit (Richard Madden) se encante perdidamente.
Talvez se pensássemos que se trata de uma história 'ultrapassada', tal comportamento de Ella não nos causasse tanto incômodo, já que teríamos em mente que não é relacionável, só que ao contrário, ficamos consecutivas vezes pensando se no lugar dela agiríamos com tal delicadeza, ou se 'chutaríamos o pau da barraca' de uma vez, sendo assim passo a me questionar se ao ficarmos tão mexidos com isso, não estaríamos nós, repercebendo a tal da moral da história? Relacionando-a nossa própria vida, quantas vezes precisamos engolir sapo e tantas outras que pensamos em vingança?
Sim, porque entre figurinos belíssimos e ambientações verdadeiramente mágicas, existe uma expectativa de que ela encontre a felicidade, acima de qualquer coisa. Novamente torcemos para que o bem vença, mas não apenas por que é o bem, mas porque conquistou o seu próprio final feliz, sempre acreditando.
E sim, como uma empresa que é, toda essa readaptação das versões feitas pela Disney em animação são uma jogada, que num artigo científico eu chamei de Metasimbologia, onde ela usa do seu próprio arcabouço imagético para criar novas imagens referentes a si mesmo, criando uma cadeia que sempre fala de si e sempre retoma para si; mesmo assim, não é possível, simplesmente descartar o quanto imergimos nesses personagens bem mais complexos, incrivelmente humanos, mas verdadeiramente mágicos.
Então Disney, não deixe de ser quem você é. Sua assinatura que te faz especial. Have courage and be kind.
P.S - O Curta Metragem Frozen - Febre Congelante é uma graça.
P.S² - Mal posso esperar para ver como serão as próximas adaptações live action disneyanas.
Um comentário
Bela analise, se já estava ansiosa pra ver agora fiquei mais ainda *-*
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