Devo admitir que no último mês eu vi poucos filmes. A maioria deles repetidos no Netflix, depois de um dia inteiro escrevendo na dissertação e/ou lendo autores diversos sobre as questões que norteiam a minha pesquisa. Sinceramente, quem nunca preferiu ver um dos seu filmes favoritos depois de um dia desses?!
Eu vinha preferindo, mas então essa semana eu me encontrei com a belezura do filme A Garota no Trem e com certeza valeu a entrada no cinema e superou as expectativas criadas (até porque eu não tinha nenhuma...)
Com certos momentos que lembram a estética de Garota exemplar, o novo longa metragem de Tate Taylor (diretor de Inverno d'Alma e Histórias Cruzadas), baseado no romance homônimo de Paula Hawkins, pode ser um excelente programa, se você vai ao cinema despretensiosamente. Assim como Garota Exemplar, A Garota do Trem se foca em múltiplas entradas, sob as perspectivas diferentes de personagens aparentemente dissonantes para construir um mistério.
Mas não se engane, essa não é apenas uma história de suspense!
Isso porque, A Garota no trem tem tantos elementos fílmicos e narrativos, que não se encaixa a um gênero só. Ao mesmo tempo que tem drama, tem suspense, tem mistério e tem romance, uma vez que os enlaces retratados na obra se focam na múltipla identidade da(s) alma(s) feminina(s). E sim, tudo nesse plural bagunçado e múltiplo.
Acontece que, A garota no trem narra a complexa relação de três mulheres, Rachel (Emily Blunt), Anna (Rebecca Ferguson) e Megan (Haley Bennett). Mulheres que têm muito mais em comum do que pensam, mas que são interconectadas (numa primeira visada) pelo passar do trem. O trem que leva Rachel do interior para a cidade grande todos os dias; o trem de ruídos que circula a casa de Anna, enquanto ela cuida de sua filha Evie; e o trem que Megan admira e sonha em poder pular dentro.
Cada uma delas tem uma razão para olhar para o trem (e pelo trem) e esse mesmo trem serve de metáfora ideal para olhar para como as suas vidas se configuraram através das escolhas que fizeram. A forma como a ligação das personagens é construída, me lembrou bastante como As Horas foi montado, através de alguns momentos específicos e de suas consequências no todo de um enredo maior. Sendo assim, vidas se cruzam e se perdem entre uma linha que as liga.
Mas daí ocorre que um assassinato (isso não é spoiler) toma o centro da narrativa e todos se tornam suspeitos, até que se prove o contrário. E daqui pra frente, nada é exatamente o que parece, uma vez que ficamos à frente de uma história de camadas, que vai se abrindo para nós gradativamente. Quase que sem pressa, mesmo que o desfecho aconteça como um solavanco.
Entre relacionamentos abusivos, formas deturpadas de ver a si próprio e mostrando como as aparências enganam, A Garota no Trem nos presenteia com enquadramentos invasivos, personagens intensos e uma vontade de retratar certa crueza nas expressões dessas mulheres. Sem medo se vai ser bonito, ou não e talvez o grande trunfo dessa narrativa more aí, na "sem vergonice" de ir direto ao ponto e mostrar frieza na psiquê humana, através de alguns plot twists instigantes.
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