Apesar da comédia Descompensada ter dado o que falar na premiação do Globo de Ouro deste ano, o filme me deixou com a impressão de que seria muito mais do que ofereceu, se transformando num bobo retrato da hipocrisia humana em celebrar a "vidaloquisse".
Escrito e protagonizado por Amy Schumer, a comédia gira em torno da complicada e totalmente transloucada vida amorosa de uma repórter de revista masculina duvidosa. Ela é uma ávida consumidora de álcool, drogas e sexo casual, sendo muitas vezes aquela que corta a chance de que este sexo casual se torne algo além disso. Adepta de um estilo de vida, que muitas vezes (no cinema) foi relacionado ao sexo masculino, Amy não entende como a sua irmã caçula Kim (Brie Larson) pode ter se casado e constituido família, quando se tem muito o que 'aproveitar' no mundo.
Bom, a história segue com uma Amy inconsequente, até que ela conhece Brandon (Bill Hader), um ortopedista sensível e especialista em esportes. Sem saber absolutamente nada sobre sensibilidade ou esportes, Amy passa a conviver com o rapaz, tendo finalmente uma oportunidade de deixar os seus muros emocionais cairem. Será?
Bom, fato que Descompensada tem alguns traços de offbeat, o que me atraiu logo de cara. Amy procurou ser uma personagem mais complexa, com mais camadas e nem um pouco mono, o problema é que a tentativa foi enfática demais. Ao invés de o comportamento ViDa LoKa dela ser natural e coerente, ele na verdade é uma clara demonstração de fraqueza e carência, mesmo que isso não seja óbvio para a personagem. Ou seja, ao invés de celebrar o "single way of life", na verdade Descompensada só reforça que é preciso de uma outra pessoa para se mudar para melhor, ser feliz e encontrar seu centro.
Sem apostar no que é obviamente engraçado, Amy tem um timming realmente interessante, que quebra certas viradas bastante clichês no filme, inclusive invertendo a ordem de alguns acontecimentos de uma tradicional comédia romântica. Mas não se engane, apesar desses insights de esperteza, eles não dominam o filme e são apenas ensejos do que, provavelmente, fez com que algumas pessoas vissem potencial.
Longe de ser um filme com personagens arrebatadores, o elenco conta também com Tilda Swinton e Ezra Miller, dois dos atores que eu mais admiro na atualidade e que realmente roubam a cena quando aparecem. Tilda e Ezra, que atuaram juntos no incrível Precisamos falar sobre Kevin, deixam os visuais andróginos de lado e entregam os personagens mais legais do longa. Tilda, com esse seu ar de superioridade e auto-suficiência, convence muito mais da mensagem inicial do filme, do que Amy.
O que mais chama atenção no filme e que pode ser considerado um trunfo narrativo, é a inversão de gêneros, uma vez que Amy não é a típica mocinha de comédias românticas e Brandon também não é o mocinho. Eles trocam de lados e Amy é o 'cara' da relação, deixando o lado mais sensível e emocional para Brandon. E apesar de fazer isso de uma forma meio instável, o filme segue numa direção que critica a superlativação das relações fugazes, onde cada vez mais as pessoas estão fugindo de construirem sólidas, porém complicadas relações (não só amorosas) umas com as outras. Amy é repleta de medos e 'proteções', não compreendendo como alguém pode dizer "Vamos marcar" e realmente marcar algo, tanto é que não sabe lidar muito bem com isso.
Então, mesmo que de modo fraco, esse ímpeto aparece e pode servir pra gente colocar em perspectiva as nossas próprias relações, consigo e com os outros.
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