Sobre a carapaça que serve


Tem gente que sente demais. Que se joga de um jeito tal, que parece não haver amanhã, sucumbindo de todos os jeitos à paixões avassaladoras, fogos que ardem de dentro para fora e vão sem nenhuma intenção de se perder no meio do caminho.
Mas eu sou da gente que pensa demais. Que cria racionalidades por cima das sensações e que tenta colocar lógica nos sentimentos, mantendo sob controle a tal chama da paixão fluorescente.
Racionalizo tanto, que, justamente por não me queimar, eu me apago antes e me coloco naquele lugar de alta proteção e pretensa segurança de que se é suficiente arder sozinha.
E a razão ganha cada vez mais força, principalmente quando a gente pensa no quanto é cobrado de ser auto-suficiente. Até mais do que auto-suficiente. É preciso ser forte. Forte para não sofrer com os desencontros contemporâneos de faces que aparecem e desaparecem na velocidade de um 'oi', configurados através do deslizar de um dedo.
Uma carapaça de controle é construída. Uma carapaça a qual impede a gente de perder a cabeça, quando os sentimentos começam a florescer. 
Só que, por experiência própria, gente assim se esquece de que tá tudo bem sofrer de vez em quando. Ta tudo bem chorar por causa de uma paixão não correspondida. Tá tudo bem sentir demais, por algo que tez sentido. Se faz sentir, é de se perguntar porque não pode não fazer sentido para o seu cérebro?
O pior é que faz um sentido momentâneo, depois para de ter lógica e a razão prevalece sufocando o turbilhão de emoções que vai surgindo com a entrega gradual. E depois...
Bom, depois pode virar mais um motivo para se esconder. E depois pode se tornar mais um pedaço dessa carapaça, que de tão frágil desaba com mais uma dessas vis tentativas de se entregar por algo além da vontade de se apaixonar.
E se tá tudo bem se permitir sentir com todas as partes de si, porque é tão difícil sentir com toda a força? 
É, e aqui to eu, de novo, racionalizando algo que deveria ser totalmente da ordem do coração...
Mas é isso aí, que o depois venha de diversas formas, em diversas possibilidades. É como têm me dito recentemente, não tem problema nenhum em ser fraco de vez em quando, ou perder o controle da sua própria carapaça. Dizem que sofrer faz parte.
E que o depois venha mesmo, com toda força, afinal de contas ele não vai deixar de chegar...mas que pelo menos ele chegue com as promessas de outros muitos depois, prontos para fazer sentir e sentido, por debaixo dessa carapaça que serve, que sabe, fazendo com que ela não caiba mais.

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