Especial Bonequinha de Luxo - Parte II

O Pretinho Básico

"Há séculos a tintura preta só era acessível aos muito ricos. No século XVII, os ricos abandonaram as cores escuras. Na era vitoriana - quando se originaram as ideias sobre o preto - era usado quase exclusivamente por quem estava de luto. (...) Mulheres usando preto, para os homens significava experiência, a usuária conhecia sexo." (Sam Wasson)



A relação do vestido preto emblemático de Audrey Hepburn em Bonequinha de Luxo, perpassa muito além da simples assinatura que ele possuia - o vestido era um original Givenchy. Na verdade, o vestido preto básico do filme é também uma espécie de marco simbólico, tanto para a moda, quanto para o próprio "ser" mulher em um período de transição tão intensa.
Só que a história do pretinho básico começa muito antes de Bonequinha de Luxo, na verdade tem marcos fundamentais que tornaram-no uma cor presente, usável e adorada entre o gênero feminino.
O preto foi por muito tempo sinal de viuvez, mas em meados do séc. XX as melindrosas carimbaram a cor como um sinal de despreocupação com amarras sociais e que o que preservavam mesmo era a sua vontade de se divertir.
O sexo também estava diretamente ligado às conotações que a cor tinha (atribuindo à mulher que usasse como experiente sexualmente) e só quem conseguiu quebrar com isto, foi Chanel que capitalizou o pretinho e o chamou de símbolo da nova modernidade. Com a sua frase "Tudo que uma mulher precisa é de um homem que a ame e um vestido preto", os tubinhos de cetim preto ficaram ainda mais comuns entre as moçoilas dos anos 30.
Sua dispersão também teve  muito a ver com o racha de 1929, quando o prático, simples e funcional tomou conta dos gostos das massas, "o vestido preto tornou-se um gesto politicamente correto. Era chique ser quadrado." (p.152)
Mas então, houve uma coleção de Dior, chamada New Look, esta coleção além de novamente dar uma silhueta a mulher, também quebrava com os paradigmas das décadas de 30-40. Ele era suntuoso, ousado, até mesmo dramático. "Dior deixou para trás as ombreiras musculosas e os tecidos duráveis do começo da década de 40. Em seu lugar, ele reintroduziu a silhueta ampulheta e o busto havia muito esquecido." (p.61)
Mas com o ressurgimento doméstico dos anos 50 nos Estados Unidos a cor voltou a ser valorizada e voltou a ser uma espécie de emblema da feminilidade. "Basta olhar os filmes: só as malditas usavam preto. (...) e antes delas, quando o filme ficava noir via todas as suas curvas na sombra, mesmo antes de abrirem suas bocas, já sabiamos que seriam fonte de confusão." (p.153)
'Correndo' nos bastidores de toda este luxo Diorniano e temas florais ciquentistas, Hubert de Givenchy era conhecido pelo seu estilo clássico, por sua simplicidade e o culto ao belo, acima de tudo "considerava a beleza e o valor artístico da moda, não a sua utilidade." (p.62). Para Audrey foi o estilista mais indicado. E para Givenchy, Audrey se tornou a musa inspiradora.
Desde que os dois trabalharam juntos em Sabrina, havia uma claúsula no contrato de Audrey que todos os figurinos utilizados por ela em seus filmes seriam assinados por Givenchy.
Assim, quando Givenchy recebeu o roteiro em que dizia: "A porta do táxi se abre e uma moça sai. Usa um vestido de noite, sem costas e carrega, além de sua bolsa, um saco de papel pardo.", preto veio à sua mente instantaneamente. Preto era uma escolha óbvia, tratava-se de uma postituta.
Só que tratava-se de Audrey também.
É verdade que Audrey usava preto antes (na verdade era uma das cores que mais usava fora das gravações), inclusive com dois vestidos memoráveis, o preto de Sabrina e o preto de Cinderela em Paris, só que em ambos os casos as suas duas personagens estavam inseridas em contextos diferentes ao de Holly. Tanto Sabrina, quanto Cinderela em Paris se passavam na Paris do mundo da moda. Bonequinha de Luxo seria gravado e também se tratava de Nova York. Como Holly Golightly teria acesso às modas das casas européiais?
Audrey confiava cegamente no bom gosto de Givenchy e ele apresentou a resposta para os problemas deles, um tubinho simples, longo sem enfeites, mas que tinha um caimento sutil: uma classe muito realistas e acessível.
Jeffrey Banks disse: "De repente, em Bonequinha de Luxo, chique não era mais uam coisa distante só para ricos. Claro, em parte inha a ver com quem Audrey era e o tipo de pessoa que ela representava para o público, mas tinha a ver também com Givenchy. Ao contrario de Balenciada, ele era um natualista e o corpo era mostrado como era. Sem enfeites, tornando o inatingível em possível." (p.154).
Depois de Bonequinha de Luxo ser lançada, o pretinho básico se tornou uma febre. Ele era tão fácil de imitar que qualquer mulher jovem de 1961 podia mandar costurar ou mesmo comprar pronto versões inspiradas no modelo de Givenchy. Claro que a maioria não era, de fato, um Givenchy, mas no final das contas se era preto, estava valendo.
Audrey tinha conseguido dar continuidade àquilo que tinha começado em A Princesa e o Plebeu: tornou emblemática, não só a personagem feminina, mas também transformou aquilo que ela portava -cabelo, roupas, sapatos - em símbolos de uma nova época. Uma nova geração.
De reprente os anseios daquela mulher em ascensão, em mudança comportamental e também psicológica estavam todos transcritos no pretinho. Ele parecia gritar e dizer: "Não preciso de um megafone da moda para me fazer ouvir. Não preciso me empetecar para ser notada. Só preciso ser eu mesma!"

Audrey Hepburn e Hubert de Givenchy

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